Já fui bem mais aberto a experiências. Houve uma época em que, para melhorar minha poesia, eu aceitaria qualquer recomendação, até a de usar monóculo e cavanhaque.

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Antes de conseguir o primeiro prêmio no concurso nacional, parecia ser só mais um poeta cheio de ilusões e de menções honrosas.

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No jardim do poema concreto, um aviso drástico: aqui, só flores de plástico.

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Pegou a cadeira de praia, os óculos de sol e instalou-se de frente para o domingo.

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Às vezes, o velho poeta se sente como se fosse um comerciante que, antes de fechar definitivamente seu estabelecimento, descobre que por muitas décadas, sem querer, vendeu aos fregueses mercadorias de má qualidade.

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O psiquiatra explicou ao velho poeta que a síndrome da falsa Beatriz é o nome do mal que acomete os que, como ele, debitam a falta de sucesso literário à insuficiente beleza de suas musas.

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Jovem poeta, se tristeza é só o que você tem, não a economize.

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Maus dias, tempo de agrura. Esteja eu onde estiver, nem a vida me procura e nem a morte me quer.

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Ninguém nunca lhes pediu isso, mas os poetas sempre souberam que sua missão no mundo é carregá-lo nos ombros, para que ninguém possa censurá-los por viverem a se lastimar.

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Lá vai o poeta todo inflado reinar o seu reinado – de dia o sol o homenageia e, à noite, o céu estrelado. Lá vai o poeta tolo ludibriado pelo caminho homenageado – se um dia, se uma noite chegar, não vai encontrar nem reino nem reinado.

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Raul Drewnick é jornalista, trabalhou 32 anos no Estado de São Paulo e na antiga revista Visão. Escrevia crônicas para o Caderno2 e para o caderno Cidades do Estadão, além da Vejinha/São Paulo, Jornal da Tarde e o antigo Diário Popular. Escreveu os livros de crônicas “Antes de Madonna” (Editora Olho d’Água) e “Pais, filhos e outros bichos” (Lazuli/Companhia Editora Nacional), além de ter feito parte de coletâneas e antologias. Possui um livro de contos e duas dezenas de novelas juvenis. Na RUBEM, escreve quinzenalmente aos domingos.