Daniel Russell Ribas*

“Eu sou forte. Mas estou cansado.” Li na internet. Leio muitas frases inspiradoras. Essa talvez tenha sido a primeira em que há uma expiração. Nós aguentamos tanta coisa!… O mundo se renovou, e não contou a ninguém. A chuva cai e me recuso a assistir minhas certezas escoarem para os bueiros. Desculpem-me, não queria soar pesado em uma segunda-feira. É um fato, não uma reclamação, assim como o som das gotas lá fora.

Alguns perderam tanto, acreditam. Cadê aquela sensação de porto seguro, a doce pequena segurança, enquanto recebemos notícias graves a cada instante? O que se esconde por debaixo das superluas? Uma era termina, mas qual é a que começa? Muitas perguntas terminadas em reticências e um misto de admiração e espanto similar a dos indígenas que encaram as caravelas vindas além-mar pela primeira e última vez.

Encaro mais como uma maratona de testes. Só que os portões estão sempre abertos, e a entrada é inevitável. Importa mesmo se é merecido ou justo? Pessoas queridas se foram. A morte é um fato, então o que fazer? Resignar não é resposta. Seguimos adiante. Caímos no céu em um solo para germinar algo, não para se perder em poças.

Recentemente, perdi um amigo para uma doença autoimune. Uma condição que iria surgir, independentemente do que ele fizesse. Inevitável. O fato é que não acabou aí. Não pode. Em meio a tudo isso, algo novo precisa surgir. Não se sabe o que, mas há um sol por trás das nuvens. É a ele que devemos alcançar. Mortes não podem ser um fim absoluto, mas uma renovação. É o sentido da vida.

Recebemos a tocha. Carregar um legado é difícil, ainda não mais quando o pedimos. O show continua, com ou sem nós. O melhor a fazer e seguir o trabalho. Como falei para uma amiga cuja madrinha morreu, você pensará em algo, mantenha o coração aberto. Vocês precisam ler o texto da Dani Haicai, de uma lindeza grandiosa que sei que fará um bom serviço. A madrinha dela se orgulhará.

Em meio a tempestade, um pequeno feixe de luz. É o suficiente para se aquecer e caminhar. Afinal, o replicante Roy Batty resumiu em seus últimos instantes que todos os momentos grandiosos se perderão como lágrimas na chuva. Hora de morrer. E a pomba voa para o alto em um céu limpo. Max, Marli, tantos outros. Estamos aqui. Vocês não serão esquecidos. Porque a obra continua, a vida importa e a chuva limpa.

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Daniel Russell Ribas é membro do coletivo “Clube da Leitura”, que organiza evento quinzenal no Rio de Janeiro. Organizou as coletâneas “Para Copacabana, com amor” (Ed. Oito e meio), “A polêmica vida do amor” e “É assim que o mundo acaba”, ambos em parceira com Flávia Iriarte e publicados pela Oito e meio, e “Monstros Gigantes – Kaijus”, em parceria com Luiz Felipe Vasquez, pela Editora Draco. Participou como autor dos livros “Clube da Leitura: modo de usar, vol. 1”, “Lama, antologia 1” (publicação independente), “Clube da Leitura, volume II”, “Sinistro! 3”, “Ponto G” (Multifoco), “Caneta, Lente & Pincel” (Ed. Flaneur), “Clube da Leitura, vol. III”, “Veredas: panorama do conto contemporâneo brasileiro” e “Encontros na Estação” (Oito e meio). Na RUBEM, escreve quinzenalmente às segundas-feiras.