Como os de tantas outras, os heróis de minha geração não salvaram o mundo. Salvaram-se, sabe Deus como, e é possível vê-los caminhando por aí, com seus cocurutos luzidios e suas barrigas calamitosas.

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De tanto ver triunfar nulidades, não hesitei: também me candidatei.

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Na autobiografia, o parnasiano narra como, no início da carreira, se sentia diminuído na comparação com um poeta velho da escola, que tinha em casa um cisne importado da França, enquanto ele não dispunha de dinheiro nem para manter uma galinha caipira.

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Não tenho forças mais para percursos maiores. Agora, quando saio de mim, fico sempre nos meus arredores.

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Queremos enganar quem? Dizemos ter Parkinson, e é Parkinson quem nos tem.

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Minha vida é um barco que navega mal, sempre à deriva, ao sabor de um advérbio ou de uma locução adverbial.

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Zombei de tantos, escarneci de tantos, e hoje só não babo também na gravata porque minhas mãos não conseguem colocá-la no pescoço.

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Sempre dei menos do que me deram. Não posso queixar-me. Tive amigos, os amigos não me tiveram.

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Raul Drewnick é jornalista, trabalhou 32 anos no Estado de São Paulo e na antiga revista Visão. Escrevia crônicas para o Caderno2 e para o caderno Cidades do Estadão, além da Vejinha/São Paulo, Jornal da Tarde e o antigo Diário Popular. Escreveu os livros de crônicas “Antes de Madonna” (Editora Olho d’Água) e “Pais, filhos e outros bichos” (Lazuli/Companhia Editora Nacional), além de ter feito parte de coletâneas e antologias. Possui um livro de contos e duas dezenas de novelas juvenis. Na RUBEM, escreve quinzenalmente aos domingos.