Que falta fazem aqueles poetas apaixonadamente românticos que não receavam declarar amor a uma mulher, a duas, a todas, sem se preocuparem com o que alguém pudesse vir a pensar deles ou delas.

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Tão inovador lhe saiu o poema, que o concretista o registrou no livro de patentes.

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O tempora, o mores, depois dos maus dias sempre vêm dias piores.

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Foram tempos insanos, letais. Morria-se de veneno colhido em lábios deliciosamente fatais.

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No tempo das rimas ricas as pobres rimas em ão andavam de pires na mão.

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Um poeta, se não puder ser tímido, há de ser discreto. Mas, quando disser palavras como rosa ou mulher, deverá parecer a todos que ninguém poderia dizê-las melhor.

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Como todo vício, a poesia, pelo menos no início, foi boa para mim.

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Nos desvarios em que me meto, sou governado por um triunvirato, eu, eu mesmo e eu de fato.

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Chega um momento em que só se pode esperar que você morra, e mesmo isso parece uma tarefa difícil demais para você.

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Se é famoso quem morreu, não se preocupe, meu amigo. Pode crer: não fui eu.

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Depois que se tornou um, ele agora só diz bom dia a outros poetas de antologia.

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Exemplo de coerência estética: na casa do poeta concreto, um jardim de grama sintética.

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Eu esperar grandes coisas da literatura não é estranho. Estranho seria ela esperar alguma coisa de mim.

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É um poeta modesto. Se precisa de uma estrela, só a pede ao almoxarifado poético se não puder reaproveitar uma antiga.

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Nas árvores do poema concreto, um comunicado drástico: passarinhos, só de plástico.

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Na ventania, o bem-te-vi se segura nos hífens para não cair.

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Venturosamente acabou a era dos poetas declamadores, que faziam trovejar palavras sobre o público antes de respingá-lo com perdigotos.

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Raul Drewnick é jornalista, trabalhou 32 anos no Estado de São Paulo e na antiga revista Visão. Escrevia crônicas para o Caderno2 e para o caderno Cidades do Estadão, além da Vejinha/São Paulo, Jornal da Tarde e o antigo Diário Popular. Escreveu os livros de crônicas “Antes de Madonna” (Editora Olho d’Água) e “Pais, filhos e outros bichos” (Lazuli/Companhia Editora Nacional), além de ter feito parte de coletâneas e antologias. Possui um livro de contos e duas dezenas de novelas juvenis. Na RUBEM, escreve quinzenalmente aos domingos.