Era o melhor poeta do município. Dizia-se dele, entre outras proezas, que ninguém matava mais convincentemente um cisne parnasiano.

***

É um desses tipos que todos acham normais e agradáveis, até o momento em que, exímios como os pistoleiros do Velho Oeste, sacam um soneto.

***

Nas barganhas de amor, a quem pouco pede nada se concede.

***

Amor é aquele sentimento compartilhado por dois seres, dos quais um é sempre bem mais tolo que o outro.

***

O homem inventou o amor e não soube dar conta dele.

***

Em ombros alheios é que as mãos dos chatos gostam de estar, sempre úmidas e afetuosas.

***

Poesia se recolhe com peneira, sem rejeitar as intromissões douradas do sol.

***

Uma mentira várias vezes repetida passa a ser uma porção de mentiras.

***

Já na primeira noite com Alícia, arranhado, mordido, arremessado para fora da cama e cavalgado por ela, entendeu por que os furacões costumam ter nome de mulher.

***

A literatura é um daqueles males que, diagnosticáveis na infância, já nessa época devem ser combatidos, antes de se transformarem naquilo que as vítimas chamam de ideal e os compêndios médicos definem como  obsessão.

***

Por bem ou por mal, o homem morre pela boca na rede social.

***

Introduzir a palavra amor numa frase é ter a esperança de que ocorra algo antes do ponto final, ainda que seja aquilo de sempre.

***

Repentinamente irada como um vento bíblico, a brisa do parque começou a sacudir o enforcado, como se ele tivesse vida e ela pudesse castigá-lo.

***

O poeta insiste em tocar violino para mulheres viciadas no som tribal do tambor.

***

Na última convenção trimestral, os poetas concretistas discutiram formas de reduzir o custo dos seguros de incêndio e transporte.

***

Querermos que a poesia nos salve não deixa de ser uma demonstração de maturidade.  Houve tempo em que nos presumíamos dignos de encarregar Deus dessa tarefa.

***

Quando você pensa que o romantismo está superado, passa um passarinho assobiando, e o que ele assobia? Danúbio azul.

_________

Raul Drewnick é jornalista, trabalhou 32 anos no Estado de São Paulo e na antiga revista Visão. Escrevia crônicas para o Caderno2 e para o caderno Cidades do Estadão, além da Vejinha/São Paulo, Jornal da Tarde e o antigo Diário Popular. Escreveu os livros de crônicas “Antes de Madonna” (Editora Olho d’Água) e “Pais, filhos e outros bichos” (Lazuli/Companhia Editora Nacional), além de ter feito parte de coletâneas e antologias. Possui um livro de contos e duas dezenas de novelas juvenis. Na RUBEM, escreve quinzenalmente aos domingos.