Seguramente deve-se incluir crônica de Rubem Braga entre as boas coisas da vida. Mesmo aquelas feitas na velhice, com menor vigor e mais afeitas às reminiscências. Em “As boas coisas da vida”, último livro lançado em vida do cronista, Braga se recorda de cidades, pessoas e episódios da sua vida, ao mesmo tempo em que mantém um olhar atento à seção de óbitos dos jornais. Sua melancolia continua ditando o tom, temperada por um humor requintado e especialmente sereno. Sobretudo, Braga não tem vergonha de dizer que são bonitas as coisas que efetivamente o são.

O cronista sabe que o mundo está cheio de horríveis problemas, e ele mesmo tem alguns bem chatos, mas decide não pensar neles e apenas viver um momento de felicidade na fresca manhã. E não há grandes motivos para o seu bem estar, apenas uma laranja para chupar, a lembrança de que há comida quente para comer, os amigos que reconhece ao longe conversando, a alegria de saber que os amigos vão bem e que suas mulheres esperam crianças. É com essas armas que enfrenta uma cidade francamente hostil, em que pululam mulheres feias e homens desagradáveis, como se houvessem combinado de sair às ruas em massa.

Nesta época Braga já estava desiludido politicamente e preferia dedicar a maior parte dos seus textos à natureza. É com esse amor que reconstrói o mapa de sua Cachoeiro pela árvores que havia em cada propriedade. São também os livros sobre a natureza que lhe interessam e viram motivação para suas crônicas (uma obra sobre baleias, as viagens de Amyr Klink, um manual do caçador). Mesmo quando o cronista cede à metalinguagem, é tornando à natureza que ele escapa.

Há ainda neste livro alguns textos poucos comuns à produção braguiana, como um ensaio sobre Rita Lee e algumas reconstruções históricas sem as características típicas da crônica. O puxa-puxa temático indicado por Bandeira, no entanto, continua presente e há casos em que não se identifica o eixo que conduz a variação na mesma crônica.

Mas ainda é o Braga e continua fazendo bem à vida a sua leitura.

Henrique  Fendrich