Semana passada fui a um casamento dos mais esperados. Os noivos são amigos de longa data e, confesso, não acreditava que os dois oficializassem a relação. Aliás, não apenas eu. Na concorrida festa, entre todos os muitos convidados, havia algum burburinho incômodo em torno da diferença de personalidade de ambos. Daria certo esta união?

Pizza, nascida em Napóles, origem humilde, ligada às tradições da terra, levou muita pancada na sua massa até crescer de verdade. Essa educação sui generis era, na realidade, a forma de exprimir carinho por parte das suas inúmeras mamas italianas. Já adulta, Pizza conquistou o mundo. Tem uma queda quase inexplicável pela cidade de São Paulo, embora lá seja proibida de circular com seu grande amigo ketchup (colocam a fofoca em dia quando ela vai ao Rio de Janeiro, mais liberal nessas questões culturais). Sua principal característica é a versatilidade e uma empatia ímpar que faz com que tenha facilidade enorme de combinar com quase qualquer indivíduo. Garota popular, circula bem entre amigos e familiares. Muito raro existir alguém que não goste dela.

Já Bacalhau tem uma história algo diferente. Navegador por excelência, nasceu nas frias águas do norte. Sua descendência nórdica mais formal e jeito comedido acabaram se encaixando à perfeição em terras portuguesas para onde emigrou ainda bem jovem. A ligação ao mar une suas origens com a terra de adoção. Mas não se enganem, também adquiriu rica experiência além-mar. É um tipo na maioria das vezes seco, mas que possui uma simplicidade que encanta muitos. Está acostumado a ocasiões especiais como Páscoa ou Natal.

Em relação à celebração, foi uma festança. Sendo indivíduos realmente populares, muitas nacionalidades estavam presentes. Por conta disso a comunicação geral esbarrava em algumas dificuldades, mesmo entre os falantes da mesma língua. Os sul-americanos adoraram saber que festa de comemoração de casamento é informalmente chamada de “copo d’água” em Portugal e que não existe pizza portuguesa nos menus das pizzarias lusitanas. Para mostrarem algo da sua cultura, brasileiros faziam trocadilhos com a expressão “acabar em pizza” e os portugueses revidavam com exemplos da popular “ficar em água de bacalhau”.

O buffet estava ótimo. Tudo do bom e do melhor para se beber e comer. Obviamente, só não foi servido nem pizza nem bacalhau aos convidados pela piada obscena óbvia que o fato poderia provocar.

Que vivam felizes para sempre.

P.s aos leitores portugueses: “acabar em pizza” significa não haver punição para uma circunstância grave.

P.s aos leitores brasileiros: “ficar em água de bacalhau” significa uma situação que não evolui, não se resolve.

_______
Marcelo Tacuchian é engenheiro naval nascido no Rio de Janeiro. Sempre usou números e planilhas eletrônicas para escrever. Pensava que era a única forma de se exprimir criativamente. Tenta agora fazer uso de palavras e editores de textos. Na sua busca por mudanças, embarcou para Portugal onde vive atualmente e se esforça para aprender a desafiadora língua local.

A participação em diversas oficinas de escrita o incentivou a divulgar seus textos. Algum de seus contos estão publicados em coletânea e tem um livro individual de crônicas (Crônicas do (Re)descobrimento. Editora Metamorfose 2022).