O simples disse sim.

Por sua vez, o complicado, aliás, como de costume e – imagina se não? – reclamando que fora pego de surpresa, precisava pensar.

O simples disse faço.

Poderia até fazer, ponderou o complicado, dependendo das condições previamente acertadas e com os recursos necessários.

O simples disse vou.

Agora? – desejou saber o complicado. Sem avisar ninguém, antes de conhecer o caminho? Ir como? A pé, de carro, bicicleta, carona?

O simples disse posso.

Posso, disse o complicado. Desde que… E passou a listar uma série extensa e pormenorizada de fatores que condicionariam a confirmação.

O simples disse amo.

Ah, o amor, segundo o complicado, é muito complicado. Tão e tanto que, em toda a sua vida, pouco conseguira afirmá-lo com segurança peremptória.

O simples chorou.

O complicado pediu licença e deixou o recinto. Ninguém sabe ao certo para onde foi, nem quando voltará.

O simples olhou nos olhos.

Certamente por algum complexo, o complicado evitou o olhar direto e franco; piscou demais, mexeu nos bolsos, conferiu as horas.

O simples se ofereceu para ajudar.

O complicado mediu suas reais possibilidades, imaginou o que o outro pensaria, montou cenários nos quais as eventuais consequências poderiam…

O simples disse não.

O complicado sabe qual é a resposta certa, mas teme ferir suscetibilidades, frustrar expectativas, ser mal interpretado.

O simples agradeceu.

Nada do que foi feito, segundo o clássico pensamento mais complicado, fugiu um milímetro da obrigação, do esperado, do justo.

O simples perdoou.

Ao complicado coube doses de rancor, hostilidade até. A eterna esperança de, na primeira chance (a qualquer momento), complicar.

O simples está no espelho, bem diante de mim.

Mas o complicado teima em não reconhecer.

__________

Rubem Penz, nascido em Porto Alegre, é escritor e músico. Cronista desde 2003, atualmente está nas páginas do jornal Metro. Entre suas publicações estão “O Y da questão” (Literalis), “Enquanto Tempo” (BesouroBox) e “Greve de Sexo” (Buqui). Sua oficina literária, a Santa Sede – crônicas de botequim, dez antologias, foi agraciada com o Prêmio Açorianos de Literatura 2016 na categoria Destaque Literário. Na RUBEM escreve quinzenalmente às sextas-feiras.