Raul Drewnick*

Amo as palavras que te nomeiam: bela, magnífica, majestosa. Tenho com elas a mesma relação que une o jardineiro às suas flores. Há sempre alguma que lhe merece mais atenção.  Eu reservo a minha para aquelas três: bela, magnífica, majestosa. E digo-as como se estivesses aqui e, ouvindo-as, as aceitasses.

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Eu sou aquele que no triplo mortal morre no salto inicial.

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Um poema concreto é aquele que se pode apalpar se o dono não estiver por perto.

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Que seja amor a última palavra que tenhas nos lábios, ainda que não a consigas pronunciar.

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Talvez venhamos a descobrir um dia o que os leitores já sabem: não somos escritores.

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Se o amor não te dispensou, é porque ainda tem planos para ti. Prepara tuas costas.

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Sempre que pensa nas mulheres dos contos de Dalton Trevisan, o que imediatamente o excita é imaginar os tufos que elas têm nas axilas, dos quais se exala um vicioso cheiro de suor e desodorante caseiro.

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A literatura, minha desculpa mais antiga, vem se tornando dia a dia menos convincente. Sinto-me como um farsante arrependido, que espera ser desmascarado para pedir perdão.

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Se não fosse o amor, como aprimoraríamos nossa falsidade?

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Estarmos mortos é uma certeza que só os outros podem ter.

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O próximo é tão mais amado quanto mais estiver de nós distanciado.

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Há leitores que não se espantam com as proezas dos heróis dos romances de cavalaria mas  consideram absurdos os vagabundos de Beckett.

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O vento brinca de teatrinho com as roupas do varal. Finge que é um policial e sacode os lençóis, interrogando: quem de vocês é o chefe, quem?

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A terra sempre se ri quando armamos aquela cara séria e perguntamos: para onde vamos?

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Se eu quiser falar com os da minha geração, só se for visitá-los no cemitério da Consolação.

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Por mais que tenhas lido, por mais que tenhas aprendido, por mais que tenhas vivido, será nenhum teu saber se não tiveres compreendido que o único sentido da vida é morrer.

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Da literatura, origem de todos os meus males, espero que, se ela não os curar, os faça ter algum sentido.

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Raul Drewnick é jornalista, trabalhou 32 anos no Estado de São Paulo e na antiga revista Visão. Escrevia crônicas para o Caderno2 e para o caderno Cidades do Estadão, além da Vejinha/São Paulo, Jornal da Tarde e o antigo Diário Popular. Escreveu os livros de crônicas “Antes de Madonna” (Editora Olho d’Água) e “Pais, filhos e outros bichos” (Lazuli/Companhia Editora Nacional), além de ter feito parte de coletâneas e antologias. Possui um livro de contos e duas dezenas de novelas juvenis. Na RUBEM, escreve quinzenalmente aos domingos.