
Um gato deveria ser um acontecimento raro, um instante de pura magia, como, no espesso negrume da tarde, a repentina floração de um arco-íris.
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Vi na tevê um cachorro tão esperto, fazendo coisas tão incríveis com uma bola de basquete, que me veio logo a frase: esse merecia ser um gato!
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Contra gatos não há argumentos.
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A cama é palco daquelas batalhas em que os conquistadores se empenham para ser conquistados e, para não haver dúvida, se rendem mais de uma vez.
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Que, se me restar ainda tempo, eu tenha a sabedoria de usá-lo falando só de amor, como sempre deveria ter feito.
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O amor é aquela farsa sem a qual não suportaríamos a crueza de viver. Os que juram amar-se sabem que mentem, mas absolvem-se porque incorrem naquela mentira que, entre todas, é a única que se pode considerar necessária.
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Não há como discordar. O modo mais natural de morrer é parar de respirar.
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Quase me envergonho da reverência que tinha por ti até nos sonhos e que me impedia de ir além dos beijos, mesmo quando mordiscavas minha orelha e me dizias vem!
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Definitivamente, não tenho coragem. A Morte precisará fazer tudo sozinha.
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O amor é ladino. Faz qualquer sanfona soar como um violino.
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Dizer que o inferno são os outros é a mais perfeita forma de terceirização que conheço. Comenta-se que foi Sartre quem a criou.
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Diante de um sabiá, Mario Quintana não cantava, para não constrangê-lo.
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Não sei nada de nada. Sei de mim. Certamente não tudo, mas o suficiente para ter, de mim, a pior das opiniões.
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Houve um tempo – curtíssimo – no qual, para saber o que era amor, eu não precisava importunar a memória nem consultar o dicionário.
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O amor é um tolo distribuindo panfletos na esquina. Todos já o conhecem. Fazem-lhe o favor de estender a mão, apanhar um e agradecer, antes de atirá-lo fora, trinta metros adiante. Depois que distribui o último, o amor recolhe os que foram atirados ao chão e volta para a esquina, para redistribuí-los.
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No amor, ou você choraminga ou você morre à míngua.
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Zelda e Scott sabiam a dose exata de veneno de que cada um precisava para não serem apenas mais um casal chato.
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* Raul Drewnick é jornalista, trabalhou 32 anos no Estado de São Paulo e na antiga revista Visão. Escrevia crônicas para o Caderno2 e para o caderno Cidades do Estadão, além da Vejinha/São Paulo, Jornal da Tarde e o antigo Diário Popular. Escreveu os livros de crônicas “Antes de Madonna” (Editora Olho d’Água) e “Pais, filhos e outros bichos” (Lazuli/Companhia Editora Nacional), além de ter feito parte de coletâneas e antologias. Possui um livro de contos e duas dezenas de novelas juvenis. Na RUBEM, escreve quinzenalmente aos domingos.
Mariza C.C. Cezar
19/06/2016
Neste domingo gélido você nos aquece com gatos e…amor! Bendito sejas! Já sinto o calor do gato enrodilhado sobre minhas pernas, e também de um amor dos idos da juventude que ficou na memória e no coração apenas como um desejo compartilhado e nunca realizado, sonhos de amor, coisas de outrora! Abraços, Mariza
Nelson Cunha
19/06/2016
Raul não para de melhorar. Viva Raul.
Luiz Carlos Cardoso
20/06/2016
Raul, mais, mais frases! Sempre leio, releio e treleio, se bem que treler não é isso. Viva!
Raul Drewnick
20/06/2016
Mariza, quem há de um dia celebrar os gatos como eles merecem? Nelson, eu sou só um fazedor de frases que às vezes acerta uma. Luiz Carlos, meu caro, quem sabe de frases é você. Você e o Fi!
Marco Antonio Martire
23/06/2016
Às vezes, tenho a sensação de que suas frases mereceriam um dia inteiro de reflexão. Grande abraço, mestre Raul!
Raul Drewnick
26/06/2016
Marco, as frases todas, no fim, não resistem a um soprinho de brisa… Abraços